CRISÁLIDA I
CRISÁLIDA I

Misteriosa crisálida,
Forma fugidia, tão pálida,
Em teu Destino tu gestas
Fins e metades funestas;

Reconheci tua imagem,
Afortunada vantagem,
Em sonho instável, perverso,
Traduzo sangue ao verso;

Digo a verdade somente,
Quem tem argila, presente
Pelo artesão concedido,
A criação é um vício;

Qual a impossível Musa
Da qual o artista se muna
Pode romper a prisão,
Cristal, luar e facão?

Vaga crisálida, vento
Potência, fogo, lamento,
Do final de uma canção,
Vens a mim, vez sim, vez não;

Se levantando nos ares,
De peitos mortos cantares,
Peçonha vinda de insetos
Avermelhados, infectos,

Está encerrada nos galhos
Só maquinando encontrar-nos,
Promessa tola, vazia,
Ela dormita, não tinha

Noção nenhuma de nada,
Mas a palavra foi dada:
E ouviu-se: vem, ó crisálida,
Faces distantes, impávidas,

Das verdes margens dos rios
Os sussurantes e frios
Lembretes 'scritos, prenúncios,
De nascimentos, anúncios,

Emerge, dentre as demais
Nos casarões naturais
Esta primeira piada,
Eternizada crisálida!

Quisera ter-te p'ra mim,
Pois sei que não tens um fim,
Olhando assim tais brancuras,
Abstrações convolutas,

Contudo, quando percebes
Aquelas vindas d'outrora,
A rima muda, e antecedes
A plenitude da aurora,

Pois no jardim perenal,
Palco central desta história,
Tudo de tipo normal
E estes poemas agora;

Mas porque tu pavimentas
Os cibernéticos passos,
Tu és por quem sou só mecenas
Sustentando artes e astros...