ODE A HERMES

Da fúlgida sombra desta estada eu venho,
Trazendo no corpo e nas várias canções,
Mortais e imortais eu já cantei e entretenho
Labuta do dia e na Noite alazões.
Que corres a esconder dos outros, deus meu?
Que foi que contigo ocorreste, ocorreu?
Agora me fala, pois vou tecer música
Bastante ouvirás por tal Noite que viça.

És Hermes dos rápidos pés que passam
Velozes, por toda a tola e bem lenta
Terra onde com embaraço dançam
Bonecos de corda do sono que atenta!
Lembram de senhores cristãos e da cruz
Mas és tu somente que vaga e aduz
Sublimes segredos em tempo e saber
Maior alquimista vens tu a bem ser!

A certos alunos mostraste o poder
Que habita potente na lux da Palavra,
Por isso me pulsa a chama a escrever
Destino do Vate que a penumbra lavra
Temente, te faço o que cabe a mortal
Cantante saudando-te, o ínfimo mal
Disperso na lira de prata adornada,
É p'ra ti a homenagem, tu ou senão nada!

São vagas lembranças da lenda vivente,
Te lembras, no entanto, que o gado de Apolo
Tomaste sem medo de ser consequente
Julgado ou sequer capturado por dolo?
Mas quando notou ele o fantástico som
Da lira que tinhas criado, qual dom,
Também Zeus tão deslumbrado te fez
Deidade do Olimpo, entre as doze tua tez!

Recordo de dia ainda fresco na mente:
Em cama macia eu pesado dormia,
Fugindo da turba cruel, diletante
Alheio eu era ao que me tolo ocorria.
Passos ressoaram na porta e então
Fizeste lembrar a terrível ação:
Queriam prender-me, levar sem despeito
P'ra que executor me mandasse p'ro leito!

Estou perto e vou terminar, mas não sem
Dizer que cessar não farei este peã
Irei declamá-lo somente e ninguém
Será de tal forma capaz, eis o afã!
Tão lépido vais co'o dia a fulgir,
Não mais traiçoeira a Noite a sumir,
Invicto vagar, caduceu de cristais,
O três-vezes-grande, esquecido jamais!