O NADA
I

Ninguém se dedica a fazer a pergunta
Que é crucial, disso tenho certeza,
Atenta-te, irmão de respostas defuntas,
Contar-te eu vou com toda minh'esperteza:

Os olhos que outrora observaram os vultos
Pairando na altura de vãos pensamentos,
Conhecem os prantos de seres estultos,
Belíssimos vermes de tristes fermentos;

Rastreio intenções execráveis, dispostas
A tudo fazer p'ra saber quem eu sou,
Sou Nada! Já digo, sabendo que gostas
Seguir-me em momentos p'ro Nada onde vou;

Silêncio de bocas, caretas de medo,
Silêncio de rostos num vago adejar,
De fins tremulantes, bandeiras solvendo,
Os corpos senis acusando falar:

Cuidado! procurem com este ser ter
Medidas p'ra não vos entrar nos palácios,
Sombrio ele é, carrasco em poder,
Turíbulos tóxicos de mortais Lácios!

Flamante, recorda desgraçado incêndio,
Também faz pensar em dementes artrópodes,
Devendo à Morte pavores, compêndio
Que mesmo podendo prever, 'inda explode!

Ingênuos sois vós, detratores tão caros,
Não sou criatura de feitos malditos,
Apenas desejo roubar as coroas
De reis infantis nos supérfluos exílios,

Confesso que faço no peito nascerem
Buracos sem Nada, que é onde eu moro,
Sorvendo as doçuras daqueles que temem
Propósito dos sentimentos canoros!