O Entreplanos
Por Alexander Stajmevit
Confesso: sou um pouco mais contido que os dois autores que me antecederam, embora ainda ache necessário lê-los, já que fornecerão toda a bagagem necessária para compreender os conceitos sobre os quais estou prestes a falar. Não só Paragon faz menção discreta mas importante ao Entreplanos, como Martins Rex discorre, no meio de divagações um tanto assustadoras, sobre o vasto panorama operacional do Caos. Mas é melhor fazer uma análise fria e explicitar desde já que ele é um tanto ressentido, o que pode nublar os fatos e lhes dar aspecto de propaganda ou de demasiadamente inflamados.
É certo que não pretendo fazer uma narrativa sobre mim ou texto com tom de manifesto. Apenas mencionarei alguns fatos que me tornam apropriado para falar deste assunto: durante três anos de minha vida - tempo que, embora pareça pequeno, é o suficiente para se familiarizar com ampla gama de fenômenos -, participei de uma série de operações secretas realizadas por mim e por meu grupo. Longe do caráter técnico-militar que este termo pode insinuar, nós éramos mais um conjunto de magos ecléticos alterando a realidade, principalmente como forma de resolver problemas de nossas vidas pessoais que não seriam resolvidos de outra forma. Arrumamos problema com as autoridades (interdimensionais, no caso), além de alguns outros grupos inimigos. Conveniência vai, inconveniência vem (e o contrário também), e viemos parar aqui.
A primeira coisa a se compreender sobre este trabalho, portanto, é que você vai econtrar opositores. Tudo que desafie as forças estabelecidas naturalmente se encaminha para esta direção, e magia não é exceção, (olha só, até rimou, isso para você ver como estou falando a verdade). Um dos motivos pelos quais isto se dá é porque o Sistema, como gosto de chamar, não aceita ser desafiado por quaisquer meios que sejam, ainda mais por aqueles que apresentam risco genuíno. Pois é, é assim que funciona. Se quiser se eximir de possíveis retalhações, peço-lhe encarecidamente que vá fazer qualquer outra coisa; vai te poupar dor de cabeça.
Dito isso, vamos entender os diferentes planos, tentando contextualizá-los ao máximo antes. Primeiro, há o Ideaplano: como seu nome indica, é ele que contém em si todas as fantasias, sonhos, aspirações, ideias ou ideais da humanidade. Por conta de sua imensidão, de englobar *todo *o campo mental de todos os humanos de todos os lugares de toda a pangeia multiversal, ele, conquanto não seja necessariamente caótico, não é fácil de navegar-se sem ajuda ou perícia. A forma que nossa Consciência (escolho este termo ao invés de “cérebro”, um carnal e mecanicista) foi criada restringe-nos à gama mínima de pensamentos compartilhados. Portanto, até podemos entrar sutilmente na cabeça de alguém - só que este alguém está pensando, fazendo e investindo esforço intelectual nas mesmas coisas nas quais NÓS estamos; para fazer uma analogia, a frequência de transmissão é a mesma. Caso contrário, seríamos capazes de ler mentes.
Se você ler com atenção o que eu disse mais acima, vai achar estranho e aparentemente contraditório o relato de Frater Paragon, cuja mente foi invadida de forma intencional por aquele responsável por lhe submeter ordálias. Como, então, isso é possível? Simples. Aqui falo de uma invasão mental inconsciente, como aquela que duas pessoas experimentam ao escolher um nome excêntrico para uma conta online, ou ao terem a mesma ideia para uma tese de doutorado; a invasão consciente, no entanto, é aquela que é perigosa, pois nem sempre pode ser notada pelo invadido. Muitas vezes, na verdade, é isso que acontece: introjeta-se na mente de alguém um pensamento paranoico-obsessivo e este alguém não sabe nem dizer o porquê nem o como de como ele foi parar lá.
No entanto, o caso de Paragon precisa ser analisado com devido contexto. É de extrema improbabilidade que um possível alvo esteja tão vulnerável assim. O que ocorre é que as sugestões ardilosas do Grão-Mestre já lhe tinham causado desconforto e desconfiança - com barreiras abertas e fraquezas expostas, foi só necessário que alguém as explorasse; no caso, o próprio Grão-Mestre. Os métodos de realizar isto em específico ficarão para outro momento, mas encontrar e valer-se dos pontos fracos de alguém é um bom início, como nos foi mostrado. Paragon, em sua síndrome de tentar ser original, ficaria chocado com sugestões que implicassem o contrário.
Isso se faz pelo Ideaplano. E aí está o problema, cowboy: mesmo que o Ideaplano seja uma fonte imensurável de conhecimentos e deleites conceituais, estamos no Plano Material. Eu posso imaginar unicórnios, posso desenhar unicórnios e posso escrever sobre unicórnios, mas isso não é materializar um unicórnio, e sim materializar a ideia de um unicórnio. Como nós sabemos, a não ser que alguém descubra um método de engenharia genética ou que haja uma mutação espontânea, não podemos ter um unicórnio, isto é, normalmente falando.
Depois do Ideaplano e do plano material, há o plano virtual, com o qual a maioria de vocês devem estar familiarizados. Ele é interessante por se inserir naturalmente numa hipotética encruzilhada entre os planos anteriores, já que permite maior trasmissão de informações - algo que pertence ao IP - enquanto que ainda trabalha com concretudes, domínio do PM. Entretanto, por mais que estejamos consideravelmente mais perto de uma expansão de consciência capaz de afetar a matéria, não é ainda o ideal, que lhes explicarei mais adiante.
Pode-se supor que o cruzamento do Materiaplano, do Ideplano e do Virtuaplano é aquilo que é chamado de Entreplanos, e sim, essa suposição está correta. Quem controla o Entreplanos e entende cada uma das especificidades dos planos anteriores pode fazer coisas de proporções extraordinárias, embora a totalidade da grandeza dessas coisas não seja aparente para os leigos. Assim, enquanto nós utilizamos a internet para tarefas comuns ou temos algumas poucas ideias interessantes ou nos focamos somente na materialidade dos conceitos, forças invisíveis e piores que aquelas atacadas por Martins Rex ditam nossa vida, se aproveitando do fato de que são invisíveis aos nossos olhos.
É isso que alguns gostam de chamar de Misteriarquia, embora eu prefira mais classificar como Madeirarquia, já que a maioria dos misteriarcas são caras-de-pau, mesmo que nem todos sejam maliciosos. Por outro lado, se todas as formas de manipulação da realidade fossem expostas, teríamos um grande problema em mãos. É por isso mesmo que confio que minhas palavras estão sendo transmitidas aos poucos (Hehe).
Para explicar de outra forma o que já foi apresentado, o Entreplanos é a fusão dos planos anteriores, dependendo das qualidades deles para se manifestar, ao passo em que os defeitos e deficiências são minimizados. Do Ideaplano, traz consigo o acesso às imensidões mentais, ao local onde tudo é possível e onde tudo ocorre; do Virtuaplano, traz a capacidade de disseminação de informações, tornando Ideias virais e fazendo com que adquiram força através da soma dos pensamentos; do Materiaplano, traz a capacidade de reverberações muitas, já que este é o plano onde estamos principalmente inseridos e é nele que desejamos a convergência de efeitos.
Só mudar o Ideaplano não adiantaria de nada, já que ele pode influenciar, mas não nos afetar diretamente fora de condições muito específicas; o Virtuaplano exerce influências mais diretas, mas são insuficientes. O que importa mesmo é o Materiaplano. Neste caso, o Caos sobre o qual Martins Rex falou sobre ganha proporções bem mais cruciais. Você pode esquecer um pouco aquela coisa de heroísmo e tudo o mais se isso não lhe agradar - o motivo pelo qual Martins fez isso é mais para incitar a criatividade (ou o ódio, ou ambos), pois é isto que o Caos é de fato: o impulso de criação. Eu sou cínico, então quero esclarecer isso antes que venham comentários indecorosos.
O Caos é uma ferramenta que deve ser utilizada para acessar o Entreplanos e manipulá-lo, visto que é parte tão crucial de todo o processo. Como? Alguns se perguntam? Por quê? Outros se questionam. Porque tudo nasce a partir do Caos, já que ele é uma força geradora. Os textos que prefaciam Aldernea falam do Caos como um gerador de múltiplas possibilidades, e essa é uma análise que está igualmente correta; algo multifacetado precisa ser visto de forma multifacetada. Portanto, para deixar claro, o Caos é tanto uma coisa quanto a outra. Confusões são desnecessárias.
Tudo bem, tudo bem. Agora, chegamos num ponto que é mais crucial do que os anteriores. Na verdade são dois pontos, e terei de falar sobre eles para que não persistam dúvidas de principiante. Sim, esse é um texto para principiantes e explica de forma rasa, porque é depois que vem o aprofundamento.
Pergunta número um: “O que você diz não é basicamente se envolver numa atividade criativa”? Sim e não. Envolver-se numa atividade criativa é coisa que pode ser feita por N razões, então não podemos chamar todo mago de artista ou todo artista de mago e vice-versa. Uma das coisas centrais é a intenção, a vontade de alterar o mundo ou a si próprio. O motivo pelo qual não sou tão liberal ao afirmar que nem toda arte é magia é porque essencialmente deve ser arte com potencial transmutativo, seja interno ou externo, e certas criações não alcançam esse patamar. Mas claro, como eu experimentei coisas realmente mágicas, minhas definições podem estar demasiadamente estritas. Quem sabe eu esteja errado, não é?
Pergunta número dois: “Como assim o Sistema vai tentar interferir?” Essa pergunta exige uma resposta mais elaborada. Quando nós estamos falando de uma mudança que nos afeta simplesmente, é bem raro que o Sistema se incomode. Quando, no entanto, estamos falando de mudanças suprapessoais, é aí que a coisa fica difícil. O Sistema não deve ser entendido como algum tipo de aparato senciente, com ser com consciência; é um conjunto de sistemas sociais do Materiaplano que tem contraparte no Ideaplano e no Virtuaplano. Por mais que Misteriarcas não estejam envolvidos com eles diretamente (embora uma parte deles conte SIM com ajuda secreta), o que ocorre é que todos sistema tentará se proteger, eliminando possíveis falhas ou agentes causadores. Por isso, não devemos ficar surpresos quando arrumarmos possíveis oponentes. Significa, por mais cômico que pareça, que estamos vencendo.
Dito isso, canalize a fonte de Caos que existe dentro de todos os seres humanos; em alguns mais, em outros menos. Ao contrário do que se pensa, a canalização do Caos pode exigir que você abra mão de sua natureza caótica ou de sua natureza ordeira, dependendo do tipo de pessoa que você é. Depois disso, sentindo os níveis de criatividade naturalmente aumentarem, utilize-os. Apenas com eles e com Intenção, por mais que não pareça, grandes mudanças podem ser feitas.
“Ora, só isso?” Outra boa pergunta. Claro que não. A página de Proposições e suas subpáginas têm uma função apenas: apresentar conceitos e explicá-los minimamente para que se tornem compreensíveis. É uma espécie de base central do qual tudo vai se desenolver - ou já se desenvolve, se preferir. As chamadas “metamorfoses”, um nome bonitinho do Curador para atualizações, são construídas em cima deste e dos outros textos.
Dito isso, com certeza nos veremos novamente. Até.